quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

CAIPIRA SHOW vs TINTO DO PIPO




Convívio ou simplesmente “ vive-o ”

DIA 7/12/07

No -2 CONTINENTAL CLUB

Estão todos convidados

sábado, 1 de dezembro de 2007

O actor

O actor acende a boca. Depois os cabelos.
Finge as suas caras nas poças interiores.
O actor põe e tira a cabeça
de búfalo.
De veado.
De rinoceronte.
Põe flores nos cornos.
Ninguém ama tão deslamadamente
como o actor.
O actor acende os pés e as mãso.
Fala devagar.
Parece que se difunde aos bocados.
Bocado de estrela.
Bocado janela para fora.
Outro bocado gruta para dentro.
O actor toma as coisas para deitar fogo
ao pequeno talento humano.
O actor estala como sal queimado.

O que rutila, o que arde destacadamente
na noite, é o actor, com
uma voz pura monotonamente batida
pela solidão universal.
O espantoso actor que tira e coloca
e retira
o adjectivo da coisa, a subtileza
da forma,
e precipita a verdade.
De um lado extrai a maçã com sua
divagação de maçã.
Fabrica peixes mergulhados na própria
labareda de peixes.
Porque o actor está como a maçã.
O actor é um peixe.

Sorri assim o actor contra a face de Deus.
Ornamenta Deus com simplicidades
silvestres.
O actor que subtrai Deus de Deus, e
dá velocidade aos lugares aéreos.
Porque o actor é uma astronave que
atravessa
a distância de Deus.
Embrulha. Desvela.
O actor diz uma palavra inaudível.
Reduz a humidade e o calor da terra
à confusão dessa palavra.
Revita o livro. Amplifica o livro.
O actor acende o livro.
Levita pelos campos como a dura água do
dia.
O actor é tremendo.
Ninguém ama tão arrebatadamente como
o actor.
Como a unidade do actor.

O actor é um advérbio que ramificou
de um substantivo.
E o substantivo retorna e gira,
e o actor é um adjectivo.
É um nome quer provém ultimamente
do Nome.
Nome que se murmura em si, e agita,
e enlouquece.
O actor é o grande Nome cheio de
holofotes.
O nome que cega.
Que sangra.
Que é o sangue.
Assim o actor levanta o corpo,
enche o corpo com melodia.
Corpo que treme de melodia.
Ninguém ama tão corporalmente como o
actor.
Como o corpo do actor.

Porque o talento é transformação.
O actor transforma a própria acção
da transformação.
Solidifica-se. Gaseifica-se. Complica-se.
O actor cresce no seu acto.
Faz crescer o acto.
O actor actifica-se.
É enorme o actor com a sua ossada de base,
com as suas tantas janelas,
e ruas -
o actor com a emotiva publicidade.
Ninguém ama tão publicamente como o
actor.
Como o secreto actor.

Em estado de graça. Em compacto
estado de pureza.
O actor ama em acção de estrela.
Acção de mímica.
O actor é um tenebroso recolhimento
de onde brota a pantomina.
O actor vê aparecer a manhã sobre a
cama.
Vê a cobra entre as pernas.
O actor vê fulminantemente
como é puro.
Ninguém ama o teatro essencial como o
actor.
Como a essência do amor do actor.
O teatro geral.

O actor em estado geral de graça.

HELBERTO HÉLDER

Poética de um Clown


Veronica Petrova

‘O clown é a poesia em acção’
Henry Miller

Segundo Roberto Ruiz, a palavra clown vem de clod, que se liga, etimologicamente, ao termo inglês "camponês" e ao seu meio rústico, a terra. Por outro lado, palhaço vem do italiano paglia (palha), material usado no revestimento de colchões, porque a primitiva roupa desse cómico era feita do mesmo pano dos colchões: um tecido grosso e listrado, e alcochoado nas partes mais salientes do corpo, fazendo de quem a vestia um verdadeiro "colchão" ambulante, protegendo-o das constantes quedas.
Na verdade palhaço e clown são termos distintos para se designar, na essência, a mesma coisa. As diferenças consistem nas linhas de trabalho. Como, por exemplo, os palhaços (ou clowns) americanos, que dão mais valor ao gag, ao número, à ideia; para eles, o que o clown vai fazer tem um maior peso. Por outro lado, existem aqueles que se preocupam principalmente com o como o clown vai realizar o seu número, não importando tanto o que ele vai fazer; assim, são mais valorizadas a lógica individual do clown e a sua personalidade; essa forma de trabalhar é uma tendência para uma abordagem mais pessoal. Podemos dizer que os clowns europeus seguem mais essa linha.

O clown tem as suas raízes na baixa comédia grega e romana, com os seus tipos característicos, e nas apresentações da commedia dell'arte. Nas festividades religiosas e nas apresentações populares da Antiguidade, havia uma alternância entre o solene e o grotesco. Esse é um facto comum a povos distintos: dos gregos até os aborígenes da Nova Guiné, passando pelos europeus da Idade Média ou pelos lamaístas do Tibete.
Esta combinação do cómico e do trágico acentua a percepção de emoções contrapostas e é muito peculiar no clown. Para Shklovski, o clown faz tudo seriamente. Ele é a encarnação do trágico na vida quotidiana; é o homem assumindo a sua humanidade e a sua fraqueza e, por isso, tornando-se cómico.

Existem dois tipos clássicos de clowns: o branco e o augusto. O clown branco é a encarnação do patrão, o intelectual, a pessoa cerebral. Tradicionalmente, tem o rosto branco, vestimenta de lantejoulas (herdada do Arlequim da commedia dell'arte), chapéu cônico e está sempre pronto a ludibriar o seu parceiro em cena. Modernamente, ele apresenta-se, muitas vezes, de smoking e de laço.
O augusto é o tolo, o eterno perdedor, o ingénuo de boa-fé, o emocional. Ele está sempre sujeito ao domínio do branco, mas, geralmente, supera-o, fazendo triunfar a pureza sobre a malícia, o bem sobre o mal. Adoum afirma que a relação desses dois tipos de clowns acaba representando cabalmente a sociedade e o sistema, e isso provoca a identificação do público com o menos favorecido, o augusto. Podemos considerar que o verdadeiro e autêntico clown é o augusto, o branco nunca o chega a ser verdadeiramente.

O clown é a exposição do ridículo e das fraquezas de cada um. Logo, ele é um tipo pessoal e único. Uma pessoa pode ter tendências para o clown branco ou para o clown augusto, dependendo da sua personalidade. O clown não representa, ele é – o que faz lembrar os bobos e os bufões da Idade Média. Não se trata de um personagem, ou seja, uma entidade externa a nós, mas da ampliação e dilatação dos aspectos ingénuos, puros e humanos (como nos clods), portanto "estúpidos", de nosso próprio ser. François Fratellini, membro de tradicional família de clowns europeus, dizia: "No teatro os comediantes fazem de conta. Nós, os clowns, fazemos as coisas com verdade."

O trabalho de criação de um clown é extremamente doloroso, pois confronta o artista consigo mesmo, colocando à mostra os recantos escondidos da sua pessoa; vem daí o seu carácter profundamente humano.

Extraído de palhacovoador.blogspot.com